O encontro entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o líder russo, Vladimir Putin, realizado na sexta-feira (15) no Alasca, foi apresentado como um possível divisor de águas na busca pela paz na guerra da Ucrânia. A reunião, no entanto, terminou sem a assinatura de um acordo formal de cessar-fogo ou qualquer compromisso concreto em relação às pautas mais urgentes. Apesar de quase três horas de conversas, o resultado final trouxe mais dúvidas do que soluções, deixando a comunidade internacional em estado de expectativa. Ainda assim, a cúpula teve grande impacto político e simbólico, principalmente para Putin, que foi recebido em solo americano com pompa inédita desde o início do conflito em 2022.
A chegada do presidente russo chamou atenção logo no primeiro momento. Ao desembarcar na Base Conjunta Elmendorf-Richardson, em Anchorage, Putin encontrou um tapete vermelho estendido, aplausos e a presença de Trump à sua espera. O aperto de mão caloroso e os sorrisos trocados contrastaram com o isolamento que o líder russo enfrentava desde o início da invasão da Ucrânia. Nos últimos anos, suas viagens internacionais se restringiram a países aliados, como Coreia do Norte e Belarus, em função do mandado de prisão expedido pelo Tribunal Penal Internacional, que o acusa de crimes de guerra. O simples fato de estar em território americano, sendo tratado como parceiro, já representou uma vitória diplomática para o Kremlin.
O momento de maior simbolismo ocorreu quando Putin aceitou embarcar na limusine blindada de Trump, dispensando o veículo presidencial russo. As imagens dos dois no mesmo carro circularam amplamente e foram vistas como demonstração de proximidade inesperada entre os líderes. Para analistas internacionais, essa recepção foi mais significativa do que qualquer declaração feita durante a reunião, pois sinalizou que Putin conseguiu reposicionar sua imagem global em apenas alguns meses.
No campo prático, porém, a reunião não trouxe resultados imediatos. Trump, em uma entrevista concedida após o encontro, limitou-se a dizer que “houve progresso” e que o caminho para encerrar a guerra deveria ser um acordo de paz direto, em vez de cessar-fogos temporários. A declaração, embora otimista, careceu de detalhes e não apresentou novos passos para pressionar a Rússia. Promessas anteriores de “consequências severas” caso Moscou não avançasse em direção a um cessar-fogo também não foram reiteradas. Para observadores, a ausência de medidas concretas foi recebida com preocupação, sobretudo porque pode ser interpretada como um recuo estratégico dos Estados Unidos.
Putin, por sua vez, aproveitou a ocasião para reafirmar demandas históricas de Moscou. Durante sua fala, evitou mencionar diretamente a Ucrânia até os minutos finais, quando declarou que a paz só seria possível com a eliminação das chamadas “causas profundas do conflito”. Essa expressão, usada repetidamente pelo Kremlin desde 2022, traduz-se em exigências maximalistas: reconhecimento da anexação da Crimeia e de regiões como Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhya e Kherson, além da neutralidade da Ucrânia e da ausência de forças estrangeiras em seu território. Tais condições, que equivalem a uma rendição completa de Kiev, continuam inaceitáveis para o governo ucraniano e inviabilizam qualquer possibilidade imediata de negociação.
Durante a coletiva, Putin ainda buscou explorar fissuras entre os Estados Unidos e seus aliados europeus. Alertou contra a “interferência externa” nos laços entre Washington e Moscou, em mais uma tentativa de ampliar divisões políticas no Ocidente. O gesto foi interpretado como parte de sua estratégia de enfraquecer a unidade europeia diante da guerra. Apesar das falas assertivas, o líder russo manteve um tom calmo, sorridente e, em alguns momentos, descontraído, algo incomum em encontros internacionais.
Trump, por outro lado, adotou postura mais contida que o habitual. Conhecido por discursos longos e repletos de improvisos, dessa vez limitou-se a declarações curtas, sem apresentar novas propostas. Afirmou apenas que “cinco a sete mil pessoas por semana” continuam morrendo no conflito e que “há uma chance muito boa” de chegar a um acordo. O contraste entre a retórica vaga de Trump e a segurança exibida por Putin levou parte da imprensa internacional a classificar a reunião como uma vitória clara para o presidente russo.
No sábado (16), Trump realizou conversas por telefone com aliados europeus e com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. Após as ligações, líderes da França, Alemanha, Reino Unido, Itália, Finlândia e Polônia divulgaram um comunicado conjunto reforçando que o próximo passo deve ser uma reunião trilateral entre Estados Unidos, Rússia e Ucrânia, com participação europeia. Zelensky, por sua vez, reiterou que nenhuma decisão sobre o futuro do país pode ser tomada sem a presença de Kiev nas negociações. O presidente ucraniano defendeu ainda a intensificação das sanções contra Moscou caso não haja avanços reais para encerrar o conflito.
As reações deixam evidente que, apesar da tentativa de Trump em se posicionar como mediador da paz, a realidade da guerra continua complexa e distante de uma solução rápida. Para Kiev, aceitar as condições russas significaria abrir mão de sua soberania, algo impensável após anos de resistência e milhares de vidas perdidas. Para Moscou, no entanto, essas exigências são vistas como não negociáveis, mantendo o impasse que paralisa qualquer perspectiva de cessar-fogo duradouro.
Mesmo sem conquistas tangíveis, o encontro no Alasca gerou imagens simbólicas que reforçam a percepção de que Putin conseguiu reverter parte de seu isolamento diplomático. Fotos dos dois líderes sorrindo, apertando as mãos e caminhando lado a lado foram divulgadas em todo o mundo, fortalecendo a narrativa russa de que a guerra não impediu sua presença no cenário internacional. Ao final da reunião, Putin ainda surpreendeu ao dizer em inglês: “Da próxima vez em Moscou”, ao que Trump respondeu, entre risos, que poderia aceitar o convite, mesmo ciente de que enfrentaria críticas internas.
A cúpula no Alasca, portanto, terminou sem avanços concretos em relação à guerra na Ucrânia, mas consolidou a reaproximação entre Washington e Moscou em termos simbólicos. Para Putin, representou uma vitória diplomática ao ser tratado como parceiro em solo americano. Para Trump, o resultado foi menos expressivo, já que saiu sem conquistas claras a apresentar aos aliados. Resta agora acompanhar se a promessa de novas conversas, possivelmente em Moscou, poderá gerar mais que gestos de cordialidade e finalmente trazer soluções reais para um conflito que já ceifou milhares de vidas e remodelou a geopolítica global.
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